Semana do Guarani – 1920, Superação e Hegemonia

O ano de 1920 começou de forma bem complicada para o Guarani. No final do ano anterior, um sério entrevero entre o clube e o presidente da Assoc. Campineira de Foot-Ball acabou numa suspensão de 5 meses, imposta pelo arrogante dirigente. O Bugre recorreu à APSA (Assoc. Athletica de Sports Athleticos) e acabaria tendo sucesso numa Assembleia realizada em 22 de janeiro, o que levou à renúncia do polêmico presidente da ACFB.

Em fevereiro a APSA abriu inscrições para o II Campeonato do Interior e ao Bugre, campeão campineiro, seria determinado que enfrentaria o poderoso Commercial FBC, em Ribeirão Preto, numa única partida eliminatória. Quem perdesse, estaria fora.

Mas o time estava sem ritmo e desentrosado. Realizara apenas um amistoso contra o Minas Geraes FBC (da 1ª Divisão da APSA) em 29/02, perdendo por 1 x 0. Resolveu-se marcar vários treinos no campo do Guanabara nos finais de tarde. No caminho para um desses treinos, no dia 9 de março, aconteceu a tragédia.

Foto de Miguel Grecco colocada em seu túmulo, no Cemitério da Saudade.

Enquanto o grupo de jogadores descia à pé a rua José Paulino para chegar ao “Ground do Guanabara” (que mais tarde seria comprado pelo Bugre, que ali construiria seu primeiro estádio), o jogador Miguel Grecco, na brincadeira, jogou um torrão de terra no companheiro Juca (José Laine). Este, pegou uma pequena e velha pistola que carregava e fingiu atirar em Grecco, mas a arma estava carregada, tinha defeito no gatilho e o gesto fez com ela disparasse, atingindo a barriga do fundador do Guarani. Grecco ficou internado até o dia 13 de março, quando veio a falecer. Nesse meio tempo, o Bugre já havia comunicado à APSA que desistia da disputa do Campeonato do Interior.

Em abril, o Dr. Dr. Sylvio de Moraes Salles, assumiu a presidência da Assoc. Campineira de Foot-Ball e passou a organizar o Campeonato Campineiro de 1920, que teria os mesmos 5 clubes do ano anterior.

O jogo de abertura da competição foi em 16 de maio, e o White Team venceu o Villa Industrial FBC por 2 x 1 (White 1 x 0 entre os 2ºs quadros).

O Guarani estrearia na semana seguinte (23/05), contra o White. O Bugre: Nico, Maneco e Tonico; Herculano, Juca e Jordão; Ricardo, Pilla, Augusto, Zequinha e Tijolo. Ao final, tranquila vitória alviverde por 3 x 0, gols de Pilla (pênalti) e Juca (2). Na preliminar, o 2º do Bugre venceu por 1 x 0, com Jayme, Eloy e Salgado; Zeca, Joca e Joaquim; Vicente, Fernandes, Annibal, Cunha e Rômulo.

No dia 30/05 o Villa Industrial bateu o Concordia por 4 x 2. Em 4 de junho divulgou-se que a Assoc. Campineira de Foot-Ball planejava construir um estádio de futebol, condizente com o desenvolvimento do esporte em Campinas (projeto que nunca sairia do papel).

Em 13/06, foi a vez de Guarani x AAPP, apitado por Odilon Penteado (APSA). O bugre foi de: Nico, Maneco e Tonico; Deputado, Juca e Jordão; Ricardo, Pilla, Romeu, Augusto e Tijolo. Para o vencedor da preliminar, entre os 2ºs quadros, estaria em disputa a Taça Casa Alberti. Pela terceira vez seguida, o alviverde venceu por 1 x 0 e gol de Tijolo.

O jornal Commercio de Campinas comentou sobre o jogo: “O quadro do Guarany soffreu uma alteração que talvez o tenha prejudicado: não jogar Hermogenes, que apezar de inscripto há três mezes, não poude figurar no team em virtude dos directores da Associação Campineira allegarem que não foi encontrada a inscripção (…) A culpa é da directoria passada da Associação que, como é publico e notório, sempre teve péssima vontade contra o Guarany, não obstante o que mais elle se eleva dia a dia no conceito publico, graças á disciplina e esforço de seus players. No jogo dos 2ºs teams sahiu victorioso o Guarany (NR: também por 1 x 0), motivo porque conquistou a bella taça offerecida pelo Sr. Carmine Alberti. Pontuamos essas linhas felicitando os torcedores, que estiveram presente ao match, pella attitude digna com que se portaram.”

O jogo seguinte do Guarani pelo Campeonato Campineiro aconteceu em 18 de julho, com vitória sobre o Concordia por 2 x 0, gols de Pilla e Ricardo. Somente uma escalação parcial do Bugre é conhecida: Nico, Maneco e Tonico (capitão); Herculano, Juca e Jordão; Ricardo, Pilla, Hermogenes e Tijolo. Na preliminar, o “segundão” bugrino também venceu: 3 x 1. O 2º Quadro bugrino: Aldo, Mario e Salgado; Santos, Raymundo e Joaquim; Vicente, Fernandes, Annibal, Romeo e Zequinha.

Veio depois uma vitória da AAPP na competição: 3 x 1 sobre o White Team, dia 8 de agosto.

Na tarde de 15 de agosto, o Guarani pegou o Villa Industrial e, com um gol de Hermógenes, venceu por 1 x 0, garantindo a liderança do 1º turno. O Bugre nessa partida: Nico, Tonico e Maneco; Herculano, Victorino e Jordão; Ricardo, Zequinha, Hermogenes, Pilla (capitão) e Tijolo. O Segundo Quadro também venceu, mas o placar final não foi divulgado.

O Campeonato Campineiro tinha cobertura também dos jornais paulistanos “A Capital” e “Correio Paulistano”, e até este momento apresentava o seguinte quadro: Guarany, 4 vitórias em 4 jogos; AAPP, 1 vitória e uma derrota em 2 jogos; White Team, 1 vitória e duas derrotas em 3 jogos; Villa Industrial, 1 vitória e 2 derrotas em 3 jogos; Concordia, 2 derrotas em 2 partidas.

Em 11 de setembro, uma pausa para uma nova convocação do Scratch Campineiro. Vão do Guarani para os treinos do 1º e 2º quadros: José Laine (“Juca”), Antonio Giudicce (“Tonico”), Herculano Camargo (“Deputado”), José de Pilla (“Pinheiro”), Miguel Buoricore (“Tijolo”), Manoel Martins (“Maneco”) e Nicolino de Vito (“Nico”).

Nessa mesma data, o clube anunciou que os sócios interessados em adquirir os distintivos oficiais podiam dirigir-se à Casa Paschoal (loja de ferragens de propriedade de Carmine Alberti), à rua 13 de Maio, nº 2, e procurar Pompeo de Vito, que os havia mandado confeccionar em São Paulo.

O Returno do Campeonato Campineiro

Pelo desnível técnico entre o Bugre e os demais clubes, o Campeonato Campineiro foi “perdendo a graça”. Para piorar, o White Team, que perdera alguns jogadores por contusões, pediu afastamento, alegando não ter mais jogadores suficientes, e somente quatro clubes seguiram na disputa. Sabe-se que a AAPP venceu o Concordia por 3 x 2 em 22/08 e que o Villa Industrial venceu a AAPP por 1 x 0, em 10 de outubro.

Em 28/11, no Hipódromo, o Bugre aplicou a maior goleada em dérbis até aquele momento: 4 x 1 sobre a AAPP. O time bugrino: Nico, Dario e Joca; Deputado, Juca e Jordão; Ricardo, Zéca, Romeu, Pilla e Miguel “Tijolo”.

Os gols, pela ordem: Lili (contra), no 1º tempo; Romeu, Zéca, Peppino (PP) e Romeu, no 2º. Na preliminar, 2º Guarany 2 x 0  2º AAPP.

O jornal Correio Paulistano assim narrou detalhes desse encontro:

Afluiu ao Hippodromo, na tarde de hontem, designada para o reencontro dos quadros do Guarany e da A. Ponte Preta, assistencia numerosa, como ha muito não registram os nossos annaes sportivos. (…) Entretando a pugna deixou muito a desejar (…) como pela superioridade manifesta do Guarany sobre seu antagonista, no decorrer do segundo meio tempo. (…) Do quadro vencedor, destacaremos a actuação de Nicolino, que teve pouco que fazer no goal; Juca, full-back, que se mostrou muito firme, Deputado, Pilla e Miguel (…)”.

Em 05/12, o Guarany venceu o Concordia por 2 x 0, num jogo que durou apenas 30 minutos. Ricardo abriu a contagem e Tijolo marcou o segundo, gol muito contestado pelo Concordia, que abandonou o campo em protesto contra o árbitro. O clube do bairro Bonfim já estava abalado com a preliminar, quando o “segundão” bugrino superou por 2 x 0 o 2º do Concordia (até então bicampeão da categoria) e conquistou antecipadamente o título de 1920.

O Bugre: Nico, Dario e Joca; Herculano, Juca e Jordão; Ricardo, Zequinha, Romeu, Pilla e Tijolo. Árbitro: Francisco P. Dardes. Os atletas bugrinos que garantiram a taça dos 2ºs Quadros (na foto): Guilherme, Salgado e Mario; Raymundo, Abilio e Ramiro; Fernandes, Joaquim, Annibal, Renato e Romulo.

Em 12/12/1920, o jogo derradeiro: Guarani 2 x 0 Villa Industrial FBC (2º Guarani 4 x 2, na preliminar). O Bugre: Nico, Dario e Joca; Zéca II, Juca e Jordão; Ricardo, Zéca I, Romeu, Pilla e Tijolo. Juiz: Benedicto do Amaral.

Taça “Câmara Municipal”

Mais um título estava conquistado e a hegemonia no futebol campineiro era agora absoluta. Desta vez foi “barba e cabelo”, com o primeiro e o segundo times chegando ao título máximo sem perderem um único ponto sequer. Com os títulos de 1919 e 1920, a belíssima Taça Câmara Municipal ficava definitivamente com aquele que em poucos anos tornou-se o maior representante no futebol da terra de Carlos Gomes.

Esse foi o último campeonato campineiro nos moldes até então praticados, já que seria substituído por um grupo regional dentro do Campeonato do Interior da APSA. Somente em 1935, com a fundação da definitiva “Liga Campineira de Futebol”, essa competição entre os principais clubes da cidade seria novamente organizada.

Em dezembro de 1920, a revista “S. Paulo Illustrado” publicou a foto do time bugrino que venceu, por goleada, o dérbi de 28 de novembro. Da nossa esquerda, em pé, são vistos: Deputado, Pilla, Romeu, Zequinha, Juca e Miguel “Tijolo”; abaixo: Ricardo, Joca, Nico, Dario e Jordão. Esta é a única foto conhecida do Campeão Campineiro de 1920 e agrademos ao pesquisador Moisés Cunha que a encontrou tão logo a revista foi digitalizada e publicada no site da Hemeroteca Nacional.

Colaborou: Fernando Pereira. Maiores detalhes no livro “Os Primeiros Passos de um Campeão” – 2ª Edição/2019.

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